terça-feira, 27 de julho de 2010

O não-sentido da vida

Gostaria muito de saber o por quê estamos presos em uma vida que não queremos, que sentimos que não nos pertence?
Todos dizem, "se não está feliz, mude".
Fácil dizer. Mudar como? O que?
Viver pela metade parece um estigma do ser humano.
Nunca ninguém se sente completo.
De tão incompleto que vive, se completo estivesse, não saberia, reclamaria.
Vejo tanta arrogância, prepotência e superficialidade o tempo inteiro que chego a desacreditar nas pessoas, no amor, na felicidade. Me embrulha o estômago, sinto náuseas.
Podem ser apenas momentos, não sei, mas imagino um mundo que possa ser pra sempre assim, inocência, pobre inocência. Tanto que beira à ingenuidade.
Me incomoda pessoas se vendendo, não no sentido literal, mas no sentido carne num açougue.
Venda seu corpo, sua inteligência, seus sentimentos.
Coloque fotos sexy na internet, se venda, seja superficial.
Não há nada profundo, nada além.
Superexposição do sexo, do amor, da vida, da felicidade.
Não sou assim, me sinto anormal por não ser assim.
Me vender pra quê?
Me cansa essa vida.
Queria tê-la totalmente diferente.
Queria a liberdade de sentir, de viver, de dizer, de amar.
O passado é perseguidor do presente, não o deixa livre nunca, está sempre rondando, se camuflando, se preparando para dar o bote.
Tanta coisa acontecendo, sempre comparações, desconfianças.
Acho que precisamos de uma pá, para cavar entre tudo isso e encontrar algo bom para sentir.
Não podemos mudar nossa vida?
Ou não queremos?
Mas como?
Não há jeito, desconfio.
Continuaremos a viver nessa superficialidade absurda, entre sexo, amor, dinheiro e felicidade.
Coma essa superficialidade com uma colher de café, pois é uma superfície tão fina, que por qualquer motivo se rompe e não sobra nada.
Sinto que esse é o não-sentido da vida.
Se contentar com a superfície fina, nunca se sentir completo e nunca conhecer o outro como ele é, apenas como se mostra ser.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Papel em branco

O papel era grande demais e o tamanho das letras não correspondia.
Mil palavras poderiam ser escritas e nem metade desse papel seria preenchido.
Um balde de tinta foi jogado no papel.
Mesmo assim não conseguiu cobrí-lo por inteiro.
O papel era bonito, porém vazio.
Nada conseguia fechar suas quatro pontas.
A tinta escorria, pingava, porém no papel não ficava.
Havia tanta coisa a ser escrita e desenhada naquele papel. Mas ele não deixava.
Talvez pelo tamanho, por sua porosidade, estava sempre vazio. Somente sua beleza clara era de se admirar.
Mas logo cansavam de olhar, havia nada, um papel cheio de nada.
Todos tentavam escrever nele, porém se cansavam. Cansavam de olhar pra ele e nada preencher. Ser tudo uma grande beleza vazia.
Esse papel ficava exposto para todos verem e se encantarem.
Mesmo que momentânea, sua beleza alva chamava a atenção.
Era imponente, grande.
Instigava a vontade de escrever nele.
Pessoas queriam escrever seus sentimentos, amores, histórias. Mas ele era irredutível. Continuava lá, branco, sem nada escrito. Tintas pingavam, nenhum conteúdo ficava.
Muito tempo se passou e o papel deixou de interessar tanto as pessoas.
Nada conseguia ser escrito, pintado, desenhado, gravado, então sua beleza não bastava mais.
O papel foi ficando amarelado.
Sua altivez estava sumindo.
E nada ainda fora escrito.
Então um dia, um poeta que passava diariamente em frente ao papel e o observava, admirava os efeitos do tempo na sua cor, e sonhava em escrever nele seu sentimento, resolveu tentar escrever na folha amarelada.
Escreveu uma só palavra.
Fechou os olhos após escrever.
Usou um lápis simples, escreveu bem clarinho com ele.
Ficou com medo de sua palavra também ser apagada.
O papel, agora amarelado, esperando tanto tempo perder a altivez de sua beleza para poderem escrever aquela palavra sinceramente, permaneceu escrito pela primeira vez.
Não escorria tinta, nada sumia como pó.
O poeta ficou surpreso, espantado. Não acreditava que sua humilde palavra ficaria escrita no papel. Mesmo que escrita a lápis poderia ser para sempre, se assim permitisse o papel e ninguém tivesse uma borracha.
Ao abrir os olhos pode ler a palavra que tinha escrito.
Ficou feliz, finalmente.
A palavra era: amor.